“Fui vender meu olho”. Essa frase tomou as redes sociais no Brasil nas últimas semanas com vídeos de pessoas que aceitaram ter a íris escaneada por uma plataforma que promete gerar uma identidade digital para cada usuário. Em troca, eles recebem um token que pode ser vendido online em troca de dinheiro.
Trata-se do projeto World, criado
por Sam Altman, CEO da OpenAI, que é a dona do ChatGPT. A operação fica por
conta da Tools for Humanity, empresa criada por Altman. Eles ja escanearam 10
milhões de íris ao redor do mundo, sendo 6,4 milhões na América do Sul. No Brasil,
100 mil.
Apesar do aparente sucesso, o
projeto é bastante polêmico. Enfrentou processos em diferentes países,
incluindo Espanha e Portugal, onde a operação está paralisada. Assim como as
impressões digitais, a íris de cada indivíduo é única. Escanear milhões delas,
então, significa ter em mãos dados sensíveis, para dizer o mínimo. Daí a
polêmica.
O projeto nega que esteja coletando dados sensíveis. “Não existe armazenamento de íris das pessoas”, afirma Rodrigo Tozzi, chefe de operações da Tools for Humanity no Brasil. “Tudo o que o projeto precisa saber [nesta fase de coleta de íris] é que você é um ser humano único. Nesse processo de verificação, nenhum nome, CPF ou e-mail do usuário é pedido. A World não quer criar um banco de dados”.
A maior utilidade disso é
confirmar com exatidão em ambientes digitais que pessoas são pessoas. É como
realizar um processo de “não sou um robô” que existe nos sites e apps hoje, mas
de forma mais segura, pois já existem IAs que quebram esse tipo de sistema. Se
a sua íris já foi escaneada por um sistema que se pretende universal, ela
bastará para provar que você é humano (que não se trata de uma íris criada por
IA, por exemplo).
Vender a íris?
No Brasil, não falta gente
dizendo que vendeu o escaneamento da íris, por R$ 300, R$ 400, R$ 700… Esses
valores são diferentes porque, na verdade, a World não paga em dinheiro pelo
processo. Ela paga com 25 unidades da criptomoeda deles, a Worldcoin (WLD). E o
valor desse ativo varia.
Tozzi ressalta que o projeto não
faz nenhuma operação de compra e venda. “É uma distribuição de tokens. Uma
forma do usuário ter uma participação no protocolo”, diz o executivo. Cada
token WLD valia US$ 1,90 pela cotação do dia 21 de janeiro. Quem vendesse sua
recompensa nesse dia, então, embolsaria R$ 287.
Logo após o usuário escanear a
íris, o sistema gera um código que será relacionado àquela biometria. Esse
código é fracionado, e cada parte fica guardada em um servidor diferente,
enquanto todos os dados são apagados do sistema. Ou seja, a plataforma sabe
apenas qual código está relacionado a determinada íris, sem ligar isso
diretamente a uma pessoa, de acordo com Tozzi.
Como escanear a íris
A imagem tirada da íris do
usuário é feita por um aparelho chamado de Orb – nada mais que uma câmera de
alta resolução. Ela faz três fotos: do rosto inteiro, do olho direito e do olho
esquerdo. Então gera-se o código do usuário, confirmando o escaneamento.
São 44 postos de coleta no
Brasil, todos em São Paulo. E Tozzi confirmou que existem planos para expansão
e que a intenção do projeto é que todo o país tenha orbs em algum momento. Para
participar, é preciso seguir os passos abaixo:
Baixar o aplicativo World App;
Agendar um horário em um dos
locais de verificação;
Ir a um dos postos e realizar o
procedimento no Orb
Para receber a recompensa em
Worldcoins é preciso ter conta em alguma exchange com suporte ao WLD (como a
Binance e o Mercado Bitcoin).
Fiscalização e riscos
O projeto está no Brasil desde
novembro de 2024, e tão logo sua operação foi anunciada, a Autoridade Nacional
de Proteção de Dados (ANPD) informou que estava fiscalizando. Mais
recentemente, a ANPD emitiu uma nota destacando a sensibilidade dos dados que a
World coleta: “Em razão dos riscos mais elevados que o tratamento desse tipo de
dado pessoal pode oferecer, o legislador conferiu a eles um regime de proteção
mais rigoroso, limitando as hipóteses legais que autorizam o seu tratamento”.
Entre as informações que a ANPD
pediu ao projeto estão o contexto em que ocorrem as atividades, a hipótese
legal que fundamenta o tratamento de dados, a transparência do tratamento de
dados pessoais e a proteção dos dados. Tozzi afirma que todas as respostas já
foram enviadas à autoridade e que a Tools for Humanity está aberta para
responder qualquer questionamento.
O mais frequente envolve o risco
de um vazamento dos dados. Tozzi argumenta que, como as informações pessoais
são apagadas e os códigos, criptografados e divididos em partes, esse problema
não existe.
Ainda assim, o projeto enfrenta
obstáculos mundo afora. Na Espanha e em Portugal, o projeto está paralisado por
força das autoridades de proteção de dados locais. Na Argentina e no Reino
Unido, Na Coreia do Sul, o país aplicou uma multa de US$ 830 mil por violação
de leis de privacidade.
Fonte: Invest News.